Um bebê de três meses te faz perder a hora. Oras, nenhum compromisso é mais urgente do que ficar olhando para um bebê de três meses, quando acorda, se espreguiça, sorri, balbucia um ruído qualquer. Principalmente se for sua cria. Aí não há como chegar no horário. Não há como chegar em lugar nenhum. Não há como chegar, porque já se está no objetivo final. Ali, no alto do lugar de onde qualquer um diz: “Agora posso morrer feliz!”.
Um bebê de três meses te faz perder o senso estético. Sim, porque de repente, você começa a ver beleza em baba, ranho, xixi, cocô... qualquer meleca que saia do seu bebê é linda! O cheiro da fralda carregada soa como perfume para o seu olfato. Babada na testa, mijada no colo, jato de cocô direto na sua boca... nada te incomoda! E a mais bela pintura de Van Gogh, fotografia de Sebastião Salgado ou película do Fellini fica sem graça, feia, se para apreciá-la você teve que deixar seu bebê com alguém munido de uma mamadeira. O mundo fica feio longe do seu bebê de três meses.
O mais prazeroso ofício, a carreira mais exitosa, o trabalho que dá sentido à sua vida perde o brilho quando você tem que deixar seu bebê de três meses. Licença maternidade e paternidade de três anos! Essa é a reivindicação que vêm à cabeça quando se tem um bebê de três meses.
A final do seu time do peito? O último capítulo da novela? A estreia da sequencia do seu filme favorito? O show da banda que você mais gosta? A nova temporada do seu seriado predileto? Aquela peça de teatro que você esperou dois anos para ver, agora em cartaz? Uma oportunidade de emprego melhor? O concurso para o emprego da sua vida? Curso grátis com todos os saltos inclusos para a prática de vôos com wingsuit? Viagem ao redor do mundo com tudo pago? A mulher mais gostosa do mundo te dando mole? A mulher mais gostosa do mundo te chamando para um ménaje à trois com uma amiga muito gostosa? Pizza de mussarela de búfala, catupiry, provolone e parmesão com bastante molho de tomate, coberta com alho frito e azeite português extra virgem, com azeitonas chilenas, feita por um pizzaiolo de uma daquelas pizzarias tradicionais da Mooca? Não! Nada é páreo para o seu bebê de três meses.
O sorriso de um bebê de três meses te faz perder o rumo, as estribeiras, a identidade. Te faz perder-se de si mesmo. Sim, basta um sorriso do seu bebê de três meses, olhando nos teus olhos. Ah... do que eu estava falando mesmo?
O choro de um bebê de três meses te faz perder o rumo, as estribeiras, a identidade. Te faz perder-se de si mesmo. Te faz perder a fome, o sono, a hora, o senso estético, tudo. Nada pode ser pior do que ouvir seu bebê de três meses berrar até perder o ar e não saber o que fazer para ajudá-lo. Onde dói? O que dói? Como faço pra parar, pra resolver?! Me levem no lugar dele! Façam essa maldade comigo, mas não com o meu bebê de três meses! Tudo, qualquer coisa, menos isso!
O seu bebê de três meses é você, mas fora. É uma parte de você. Sua melhor parte, misturada com a melhor parte de quem te ajudou a fazer o bebê. É você apartado de si mesmo. O seu bebê de três meses te faz reviver teus primeiros três meses. Te faz redescobrir, renascer. É você renascido. Mas apartado, autônomo. Este renascimento lhe trouxe uma parte sua que você não controla, não sabe ao certo. Uma parte com vida própria. É preciso aprender essa relação inédita e única. Por mais que você se veja no seu bebê de três meses, ele sobreviverá a você.
Minha filha tem agora três meses desde que foi parida. E já é capaz de fazer tudo isso comigo. Fico imaginando quando ela tiver um ano, dois, dez, vinte, trinta, a minha idade... Começo a entender um pouco o que antes eu supunha que já compreendia quando meus pais me diziam: “Quando você tiver filhos, vai entender!”.
Caio Dezorzi
2013, por volta do solstício de verão do hemisfério sul